sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

A Princesa Isabel e a Lei Áurea

       
Princesa Isabel
Fonte: Wikipédia
       A escravidão, desde a antiguidade, sempre esteve presente na história da humanidade. Em todos os povos, os derrotados de guerras e os seres de culturas diferentes foram capturados e escravizados. No Brasil, devido à necessidade de mão de obra nas lavouras, o mercado escravagista expandiu-se devido à facilidade de trazer povos capturados do continente africano. Por causa da superioridade econômica e militar dos povos europeus, a subjugação dos povos africanos ocorreu e manteve-se ativa, devido ao comércio lucrativo que enriquecia os escravagistas.
      A libertação dos escravos no Brasil ocorreu de forma gradativa; surgiu a “Lei Eusébio de Queirós” de 1850, que proibia o tráfico interatlântico de escravos; depois veio a “Lei do Ventre Livre” de 1871, que libertava todas as crianças nascidas de pais escravos; depois a “Lei Saraiva-Cotegipe” ou “Lei dos Sexagenários” de 1885, que dava liberdade aos escravos com mais de 65 anos de idade. Em 13 de Maio de 1888 foi assinada, por Dona Isabel, princesa imperial do Brasil, e pelo ministro da Agricultura, o conselheiro Rodrigo Augusto da Silva, a “Lei Áurea” que extinguia, de forma oficial, a escravidão no Brasil.
      O processo de liberdade dos escravos no Brasil ocorreu devido à contribuição de inúmeros abolicionistas, motivados por ideais humanistas e religiosos; também, por influência cultural e econômica europeia que provocou a mudança econômica nos trabalhos de lavoura no país.
      Na dimensão astral houve grande trabalho, dos Espíritos Guardiões e de Seres comprometidos com o bem, para impulsionar a fase de liberdade, devido à nova etapa de evolução no resgate cármico planetário.
      No texto abaixo, a entidade espiritual que se utiliza da forma astral como Vovó Catarina nos traz vários informativos para a nossa reflexão. 
      Podemos compreender que todo período de sofrimento, através da escravidão, é devido a um resgate cármico. Mas através deste raciocínio surge uma dúvida. Então, é uma necessidade haver este tipo de sofrimento? A humanidade sempre sofrerá com períodos de resgates cármicos? Procurando compreender a “Lei de Causa e Efeito” percebemos que esses períodos de resgates cármicos não é uma necessidade e sim uma consequência. Eles se tornarão mais brandos à medida que a humanidade despertar os valores morais crísticos e deixar de gerar sofrimento. Vovó Catarina nos conta que o sofrimento particular dela e de outros diante das torturas que os escravos receberam com a marcação a ferro é consequência de eles, como inquisidores em encarnação anterior, terem produzidos sofrimentos semelhantes. Como o planeta vai saindo, de forma gradativa, da fase de “Provas e Expiações”, ainda vive-se o processo de resgate através do sofrimento gerado em vidas passadas. Enquanto a humanidade não despertar para a compreensão da atuação da “Lei de Causa e Efeito” haverá resgates cármicos individuais e coletivos.
     Outra abordagem interessante que ela faz é sobre os médiuns “espiritualizados” que demonstram preconceitos em receberem pretos velhos. Na verdade o preconceito estende-se também às entidades “vestidas” como caboclos, boiadeiros, ciganos, etc. Esses médiuns permanecem valorizando mais a forma exterior do que a irmandade que há na diversidade comprometida com a prática  da caridade.
     Podemos também compreender como surgiu o mau uso da “Magia”. Os escravos, após a “Lei Áurea”, ficaram escravizados pela necessidade de sobrevivência e começaram a comercializar os conhecimentos magísticos das práticas de suas religiões.  Pela “Lei de Identidade Vibratória”, atraíram o assessoramento de entidades das regiões trevosas, gerando com isso um novo débito perante as Leis Divinas, que terá que ser resgatado, dentro da “Lei de Causa e Efeito”, através de sofrimentos semelhantes, provocados.
     Esta história contada por Vovó Benta contribui para o nosso despertar da compreensão do nosso processo evolutivo e a Lei de Causa e Efeito.
V. Lau


Erechim (RS), janeiro de 2006.
Senzala no Céu?
     - Isso mesmo, meu camboninho. Isso mesmo. Negra velha lembra como se fosse hoje:
     “Um sem número de escravos, judiados pela dureza a que eram submetidos nas fazendas do Brasil, desencarnavam ainda em tenra idade. Essa negra velha e alguns outros, mais obedientes às ordens do patrãozinho, conseguiram chegar até a velhice habitando o corpo de carne. Quando adoeci, só pedia a Zambi, que compreendia ser um Pai muito bondoso, que não olhasse as mágoas que ainda guardava no coração, pelos filhos arrancados de nossas mãos, e que me recolhesse em qualquer uma de Suas moradas. Rogava em minhas orações que se fizesse a Sua vontade, mas que a minha era de poder me encontrar, nas paragens do céu, com o mestiço Tião, a quem meu coração havia amado tanto e padecido mais ainda vendo-o morrer injustiçado no tronco, açoitado e sangrando.
     Numa noite estrelada, deitei o corpo cansado da lide do dia sobre as palhas que faziam minha cama e, durante minha reza, senti uma agulhada forte no coração, ao mesmo tempo em que a vista escurecera. Acordei num lugar muito diferente da senzala onde havia adormecido. Era tudo muito bonito e limpo, e eu estava deitada numa cama macia e cheirosa, como aquelas da Casa Grande. Olhando ao redor, percebi que havia muitos outros negros que, como eu, acordavam atordoados. Fechei os olhos e adormeci para acordar um tempo depois com o meu Tião aos pés de meu leito. Pensei estar sonhando, não fosse o sorriso e o abraço que recebi, que me fizeram ver onde estava. Não cabia em mim de felicidade e, tão logo me recuperei, pude visitar com ele aquelas paragens a que chamavam Aruanda. Reencontrei dezenas de negros que vi morrer na Terra sob ferro quente, sob o chicote do feitor ou por causa das pestes que os faziam agonizar.”
     - Olha, camboninho, se negra velha não estivesse morta poderia dizer que morreria de tanta emoção, eh, eh. Lá éramos tratados como gente e tínhamos direitos como os brancos da Terra. Podíamos glorificar nossos Orixás, e, em pouco tempo, alguns de nós, em caravana, desciam à Terra para socorrer os irmãos que desencarnavam. Naquele tempo, haveria grande movimentação nas terras do Cruzeiro, pois seria assinado um tratado de libertação para os escravos que ainda habitavam a carne. Muitos de nós, em espírito, éramos convocados por nossos superiores a fim de auxiliar os guias de luz a defender aquela que seria a redentora. E, do outro lado da vida, vimos nosso povo ser liberto pela lei e tornar-se escravo pela necessidade. A miséria imposta pela falta de tudo fez meu povo vender o que tinha de mais sagrado: a fé. Em troca de moedas que garantiam o sustento, vendiam a magia trazida de outras terras, a qual sempre lhes servira para a elevação espiritual. Muitos se perderam e, além da revolta e da miséria, passaram a se aliar às trevas. A provação que visava ao resgate do último ceitil, para muitos de nossos irmãos, estava perdendo o sentido. O coração desta negra velha batia descompassado e, não fosse a benevolência de nossos superiores a nos instruir e pedir paciência, teria se desequilibrado diante de tanta dor pelos filhos que se perdiam na carne. Tião, Espírito de inigualável brandura, acalmava-me, e assim pudemos, juntos, assistir à maior festa de que já se teve notícia lá pelas bandas de Aruanda. Ela aconteceu trinta e três anos depois da libertação. Atentos e felizes, esperávamos o momento em que o portão daquela senzala se abrisse para deixar entrar alguém que acabara de deixar o corpo carnal após cumprir sua grande tarefa no plano terreno. Os tambores anunciaram sua chegada e, envolta numa claridade ímpar que saía de seu coração, ela desembarcava diante de nós. Era uma branca em território negro. Era uma princesa visitando a senzala. Brados de alegria eram retribuídos pelo doce sorriso e por sua aura de luz, que a todos nós envolvia como num abraço fraternal. Estava de passagem e nos brindava com sua visita.
     - Então minha mãe conheceu a princesa?
- Eh, eh, meu camboninho. Deste lado da vida não existem majestades, todos se igualam, o preto e o branco. Só o que separa uns espíritos dos outros é a evolução alcançada, mas mesmo esta não é empecilho para que estejamos nos ajudando permanentemente. Os bons de hoje já foram aqueles que feriram e que, depois de se ferirem, aprenderam que a dor é o melhor remédio. Se a escravidão da carne nos foi dada numa encarnação é porque outrora, ignorando as Leis Maiores, assenhoramo-nos de direitos que não nos cabiam. Com malícia, egoísmo e orgulho, escravizamos nosso espírito, atrelando-nos a um carma pesado. Tendo sido inquisidores no passado, com o mesmo fogo com que calamos nossos irmãos, fomos marcados como animais. A princesa, da mesma forma, renasceu na Terra para cumprir o que havia se omitido no passado, pois, se não fazer o mal bastasse, a evolução não se daria. É preciso e necessário realizar o bem, e este nos aguarda em cada encruzilhada da estrada. Oportunidades nos são ofertadas diariamente, cabe-nos ter olhos abertos para ver.
     - E, hoje, vó Catarina, onde está a princesa?
     - Camboninho é curioso! Negra Velha já esbarrou com o espírito da redentora pelos terreiros da vida. Isso mesmo! Entre tambores e defumações, já a vimos, como qualquer um de nós que trabalhamos para Aruanda, vestir seu traje de preta velha e vir socorrer os filhos da Terra. E ainda tem mais, camboninho. Já vi médium se negar a recebê-la, por preconceito com os pretos velhos. Eh, eh, meu filho! Vê agora como são as coisas? Será que algum médium se omitiria a recebê-la se soubesse quem já fora? Ainda há de chegar o dia, meu cambono, em que os filhos de todos os terreiros terão a fé inquestionável e permitirão branquear a alma para que a Luz que tanto anseia em dominar o coração dos homens possa fazer morada por aqui também. Por que as lágrimas, meu menino?
     - Porque sinto vergonha de só ter a pele branca, minha mãe. Queria ter o coração tão alvo que pudesse ser capaz de mostrar às pessoas a grandeza de nossa divina umbanda e de suas falanges de luzeiros.
     - Salve, meu camboninho! Que essas lágrimas de reconhecimento possam ser levadas até a cachoeira de Oxum e que esse Sagrado Orixá as recolha para fazer delas as pérolas que te serão devolvidas no caminho de volta. A bênção de Zambi, filho de meu coração.
     Vó Catarina despedia-se, enquanto repassava toda sua emoção com as lágrimas que rolavam do rosto de seu aparelho.
     O camboninho sentiu um caloroso abraço. Sabia que já o havia ganhado, pois a energia era inconfundível. Seu coração batia muito forte toda vez que trabalhava com aquela preta velha, dizendo que um elo de amor os unia em espírito. O que não podia lembrar é que ele era o mesmo mestiço Tião de outrora.
     Se as correntes da ignorância aprisionam, a busca incessante da sabedoria é a chave que liberta. Os dois lados da vida se fundem quando o elo é o amor.
     “Causos de Umbanda” – A psicologia dos pretos velhos / Vovó Benta (Espírito) – 1ª ed. – Limeira, SP: Editora do Conhecimento, 2006.

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